Crianças francesas não fazem manhã: Os segredos parisienses para educar os filhos
Druck Erman, Pamela
Lido em dezembro e janeiro de 2025
Antes de eu ter filhos, nunca prestei atenção nos filhos de ninguém. E agora, praticamente só olho para a minha. Mas, em nossa infelicidade atual, não consigo deixar de perceber que parece haver outro jeito. Mas qual é, exatamente? Será que as crianças francesas são geneticamente mais calmas do que as nossas? Será que foram subornadas (ou ameaçadas) para serem submissas? Será que são produto de uma filosofia de criação antiga sobre a qual ninguém fala?
Os pais franceses são muito preocupados com os filhos. Eles sabem sobre pedófilos, alergias e perigos de engasgo. Tomam precauções lógicas. Mas não vivem em pânico pelo bem-estar dos filhos. Essa aparência mais calma os torna melhores tanto em estabelecer limites quanto em dar autonomia a eles.
Isso corrobora minhas próprias observações em Paris e em viagens de visita aos Estados Unidos: tem alguma coisa no jeito que os franceses educam os filhos que torna a tarefa menos massacrante e mais prazerosa.
Os pais franceses querem que os filhos sejam estimulados, mas não o tempo todo. Enquanto algumas crianças pequenas americanas estão tendo aulas de mandarim e pré-treinamento para a alfabetização, as crianças francesas estão (propositalmente) agindo como crianças pequenas.
Os franceses têm todo tipo de serviço público que ajuda a tornar a ideia de ter filhos mais atraente e menos estressante. Os pais não precisam pagar pela pré-escola, nem se preocupar com planos de saúde e nem guardar dinheiro para a faculdade. Muitos recebem ajuda financeira mensal, transferida diretamente para suas contas bancárias, só por terem filhos.
Capítulo 1: Você está esperando uma criança?
Embora Paris seja uma das cidades mais cosmopolitas do planeta, eu me sinto distante. Em francês, não identifico pessoas importantes quando são citadas, nem histórias de faculdade e nem nada que, para um francês, poderia sinalizar o ranking e a importância social de alguém. E, como sou estrangeira, os franceses também não sabem meu status. Quando fiz as malas e fui para Paris, nunca imaginei que a mudança seria permanente.
Capítulo 2: Paris está arrotando
As francesas que conheço não são nada indiferentes quanto à maternidade, nem quanto ao bem-estar dos seus bebês. São temerosas, preocupadas e estão cientes da imensa transformação que estão prestes a passar na vida. Mas elas sinalizam isso de forma diferente. As mulheres americanas tipicamente demonstram sua dedicação se preocupando e deixando claro o quanto estão dispostas a se sacrificar, mesmo durante a gravidez; as mulheres francesas demonstram sua dedicação projetando calma e exibindo o fato de que não renunciaram ao prazer.
“Nove meses de spa” é a manchete de uma revista francesa. O guia para novas mães, um livreto gratuito preparado com o apoio do Ministério da Saúde francês, diz que as dicas alimentares favorecem o “crescimento harmonioso” do bebê e que as mulheres deveriam procurar “inspiração” em diferentes sabores. “A gravidez deveria ser um momento
Todo mundo acha natural que as mulheres grávidas devam lutar para manter o corpo intacto. Enquanto minha podóloga trabalha nos meus pés, ela diz de repente que devo passar óleo de amêndoas doces na barriga para evitar estrias. (Faço isso com obediência e não tenho nenhuma.)
Capítulo 3: Cumprindo as noites
Todo mundo sabe que bebês pequenos dormem mal. Conheço alguns americanos que, por pura sorte, têm bebês dessa idade que dormem às 21h e acordam às 7h. Mas a maioria dos pais não tem uma noite ininterrupta de sono até os filhos fazerem um ano, mais ou menos. Eu conheço crianças de 4 anos que ainda vão para o quarto dos pais à noite.
Mas isso não parece fazer uma diferença crucial. Os bebês franceses amamentados ao seio que conheço cumprem a noite desde cedo também. Algumas mães francesas que conheço me dizem que pararam de amamentar quando voltaram a trabalhar, por volta dos 3 meses. Mas, àquelas alturas, os bebês já estavam cumprindo as noites.
Todos com quem eu falo acham natural que os bebês consigam e provavelmente já durmam a noite toda por volta dos 6 meses de idade, e frequentemente bem antes disso. “Alguns bebês começam a dormir a noite toda com 6 semanas, outros precisam de quatro meses para encontrar seu ritmo”, diz um artigo na revista Maman!
“Minha primeira intervenção é para dizer que, quando seu bebê nasce, você não precisa pular em cima dele à noite”, diz Cohen. “Dê a seu bebê a chance de se acalmar sozinho, não responda automaticamente. Mesmo logo depois do nascimento.”
“Os pais que demoravam um pouco mais a atender quando o bebê chorava de madrugada sempre tiveram filhos que dormiam melhor, enquanto os pais ansiosos tinham filhos que acordavam repetidamente à noite até se tornar insuportável”, escreve ele. A maior parte dos bebês que Cohen atende é amamentada no seio. Isso não parece fazer diferença.
Uma razão para fazer a pausa é que os bebês pequenos fazem muitos movimentos e barulhos enquanto dormem. Isso é normal e não tem problema. Se os pais correm e pegam o bebê cada vez que ele faz um barulhinho, às vezes acabam acordando – o.
Outra razão para fazer a pausa é que os bebês acordam entre seus ciclos de sono, que duram por volta de duas horas. É normal que chorem um pouco quando estão começando a aprender a conectar esses ciclos. Se a mãe ou o pai automaticamente interpreta esse choro como fome ou sinal de incômodo e corre para acalmar o bebê, ele terá dificuldade em conectar os ciclos sozinho. Ou seja, ele precisará que um adulto vá acalmá-lo até voltar a dormir ao fim de cada ciclo.
Alexandra, cujas filhas dormem a noite toda desde que ainda estavam no hospital, diz que é claro que não ia correndo para cima delas no mesmo segundo em que choravam. Às vezes, ela esperava de cinco a dez minutos antes de pegá-las. Queria ver se elas precisavam voltar a dormir entre ciclos do sono ou se alguma coisa as estava incomodando: fome, fralda suja ou apenas ansiedade.
(Ela acrescenta que existe outra razão para A Pausa: “para ensiná-los a ter paciência”.)
Os estudos que li mostram que, quando uma criança dorme mal, isso afeta o resto da família, inclusive provocando depressão na mãe e prejudicando o funcionamento geral da família. Inversamente, quando os bebês dormem melhor, os pais relataram que o casamento melhorou e que se tornaram pais melhores e menos estressados.
De acordo com Le sommeil, le rêve et l’enfant, “sempre atender às exigências dele e nunca dizer ‘não’ é perigoso para a construção da personalidade. Porque a criança não vai ter nenhuma barreira contra a qual lutar, para saber o que se espera dela”.
“O bebê pequeno aprende no berço que pode ficar sozinho de vez em quando, sem estar com fome, sem estar com sede, sem dormir, só ficando acordado calmamente. Desde muito pequeno, ele precisa de um tempo sozinho e precisa adormecer e despertar sem ser imediatamente observado pela mãe.”
Capítulo 4: Espere!
Embora eu tenha feito progressos na França, sinto saudade dos Estados Unidos. Sinto falta de ir ao mercado de calça de moletom, de sorrir para estranhos e de poder falar besteira. Mais do que tudo, sinto saudade dos meus pais. Não consigo acreditar que estou criando uma filha a 7 mil quilômetros de distância deles.
No assunto de quando alimentar os bebês, os pais americanos mais uma vez ficam em lados opostos. Pode – se chamar de luta da comida: um grupo acredita em alimentar os bebês em horários predeterminados. Outro diz para alimentá-los quando parecerem com fome. O site americano BabyCenter dá oito exemplos diferentes de planejamento para bebês de 5 a 6 meses, inclusive um no qual os bebês se alimentam dez vezes por dia.
Desde os 4 meses, a maior parte dos bebês franceses se alimenta em horários regulares. Assim como com as técnicas de sono, os pais franceses veem isso como bom – senso, não como parte de filosofia de criação.
Com pequenas variações, as mães me contam que seus bebês se alimentam às 8h, 12h, 16h e 20h. Votre enfant, um respeitado guia francês voltado para os pais, tem apenas um exemplo de cardápio para bebês de 4 a 5 meses. É essa mesma sequência de alimentação.
O maior mistério para mim é como todos esses bebês franceses são capazes de esperar quatro horas entre uma refeição e outra. Bean fica ansiosa se tem que esperar mesmo alguns minutos para comer. Nós ficamos ansiosos também. Mas estou começando a achar que tem muita espera acontecendo na França. Primeiro, havia A Pausa, na qual os pais franceses esperam quando o bebê acorda. Agora, tem o planejamento de refeições do bebê, no qual eles esperam durante longos períodos de uma refeição até a próxima. E, é claro, tem todas aquelas crianças pequenas esperando com alegria no restaurante até a comida chegar.
Mischel é famoso por criar o “teste do marshmallow” no final dos anos 1960, quando estava em Stanford. Nesse teste, um experimentador leva uma criança de 4 ou 5 anos para uma sala onde tem um marshmallow sobre a mesa. O experimentador diz que vai sair da sala por um tempinho. Se a criança conseguir não comer o marshmallow até ele voltar, vai ganhar dois marshmallows. Se comer o marshmallow, só vai ficar com aquele mesmo.
É um teste muito difícil. Das 653 crianças que o fizeram nos anos 1960 e 1970, só uma em cada três conseguiu resistir a comer o marshmallow durante os 15 minutos em que o experimentador passou fora. Algumas comeram assim que ficaram sozinhas. A maioria só conseguiu esperar uns trinta segundos.
Será que fazer as crianças esperarem pela gratificação, como os pais da classe média francesa fazem, poderia torná-las mais calmas e flexíveis? Enquanto as crianças americanas de classe média, que em geral estão mais acostumadas a conseguir o que querem imediatamente, desmoronam em situações de estresse?
Ter filhos que sabem esperar torna a vida familiar mais agradável. As crianças na França “parecem bem mais disciplinadas e criadas de um jeito mais parecido com o que eu fui”, diz Mischel. “Com amigos franceses vindo visitar com crianças pequenas, você ainda consegue fazer um jantar francês … a expectativa com as crianças francesas é que elas se comportem de uma maneira apropriada e calma e se divirtam no jantar.”
Os pais e cuidadores franceses não acham que as crianças têm paciência infinita. Não esperam que crianças pequenas passem sinfonias ou banquetes formais inteiros sentadas. Costumam falar sobre esperar em termos de minutos ou segundos.
estou convencida de que o segredo de as crianças francesas raramente choramingarem ou terem crises de birra (ou pelo menos em menor quantidade do que as crianças americanas) é que elas desenvolveram os recursos internos para lidar com a frustração.
O primeiro bolo que a maior parte das crianças francesas aprende a fazer é o gâteau au yaourt (bolo de iogurte), no qual o pote vazio de iogurte é usado para medir os outros ingredientes. É um bolo leve e não muito doce, ao qual frutas vermelhas, gotas de chocolate, limão ou colheradas de rum podem ser acrescentados.
Tanta atividade na cozinha não apenas rende muitos bolos. Também ensina as crianças a se controlarem. Com as medidas ordenadas e a sequência de ingredientes, fazer bolos é a aula perfeita de paciência.
Martine também ensina aos filhos uma outra habilidade relacionada: saberem brincar sozinhos. “A coisa mais importante é que ele aprenda a ser feliz sozinho”, diz ela sobre o filho, Auguste. Uma criança que consegue brincar sozinha pode usar essa capacidade quando a mãe está no telefone.
Assim como com o sono, tendemos a ver se as crianças são boas em esperar como uma questão de temperamento. Em nossa visão, os pais tiram a sorte grande e ganham uma criança que sabe esperar, ou não.
Na França, não existe tanta ambivalência com o “non”. “Você precisa ensinar a frustração ao seu filho” é uma máxima entre pais franceses.
No livro Un enfant heureux (Uma criança feliz), o psicólogo francês Didier Pleux argumenta que a melhor maneira de fazer uma criança feliz é frustrando – a.
Walter Mischel diz que ceder às crianças desperta um ciclo perigoso. “Se as crianças têm a experiência de que, quando você as manda esperar, se elas gritarem, a mamãe vem correndo e a espera acabar, elas vão rapidamente aprender a não esperar. A não espera, o grito, a continuidade do ato e o choro estão sendo recompensados.”
Uma psicóloga francesa escreve8 que, quando uma criança tem um caprice (por exemplo, a mãe está em uma loja com ela e de repente ela pede um brinquedo), a mãe deve ficar extremamente calma e gentilmente explicar que o brinquedo não está nos planos daquele dia. Em seguida, deve tentar “contornar” o capriche com o redirecionamento da atenção da criança, por exemplo, contando uma história de sua própria vida. “Histórias sobre os pais sempre são interessantes para as crianças”, diz o psicólogo.
Um psiquiatra infantil francês escreve que essa éducation deve começar quando o bebê tem de 3 a 6 meses. “A mãe começa a fazê-lo esperar um pouco às vezes, introduzindo uma dimensão temporal à realidade dele. É graças a essas pequenas frustrações que os pais impõem a ele dia após dia, junto com o amor que sentem, que fica permitido suportar e renunciar, entre as idades de 2 a 4 anos, de sua condição de todo – poderoso, como forma de humanização. Essa renúncia nem sempre é clara, mas é uma passagem obrigatória.”
Capítulo 5: Pequenos humanos
Nos anos 1960, o psicólogo suíço Jean Piaget foi aos Estados Unidos compartilhar suas teorias sobre os estágios do desenvolvimento infantil. Depois de cada palestra, alguém na plateia costumava lhe perguntar o que ele passou a chamar de A Pergunta Americana: como podemos acelerar esses estágios?
A resposta de Piaget era: por que você iria querer fazer isso? Ele achava que forçar as crianças a adquirirem habilidades antes da hora não era possível e nem desejável. Acreditava que as crianças chegam a esses marcos em seu próprio passo, guiadas por seus motores internos. A Pergunta Americana resume uma diferença essencial entre os pais franceses e os americanos. Nós, americanos, nos damos a função de motivar, estimular e carregar nossos filhos de um estágio de desenvolvimento ao seguinte. Achamos que, quanto melhores pais formos, mais rápido nossos filhos vão se desenvolver.
“Sabe qual é a maneira mais certa de deixar seu filho infeliz?”, escreve ele. “É acostumá-lo a receber tudo. Como seus desejos crescem constantemente devido à facilidade em satisfazê-los, mais cedo ou mais tarde a impotência vai forçar você, contra sua vontade, a acabar negando. Essa recusa a qual não está acostumado vai atormentá-lo mais do que ser privado de seus desejos.”
Os pais que vejo em Paris hoje em dia parecem ter encontrado um equilíbrio entre ouvir os filhos e serem claros que são os pais que mandam (mesmo que às vezes precisem lembrar a si mesmos disso). Os pais franceses escutam os filhos o tempo todo. Mas se a pequena Agathe diz que quer almoçar pain au chocolat, ela não vai ter o que quer.
Capítulo 6: Creche?
Às vezes não sei que é feriado nacional até sair para a rua e ver que todas as lojas estão fechadas. Colocar Bean em uma creche nos aproximaria mais da França.
O sistema de creche militar americano se parece muito com o sistema francês. As horas de funcionamento estão diretamente associadas ao horário de trabalho. O valor a pagar varia de acordo com a renda combinada dos pais. O governo subsidia metade do custo.
As crianças não aprendem a ler na creche. Não aprendem o alfabeto e nem qualquer outra habilidade de pré-alfabetização. O que elas fazem é socializar com outras crianças.
Bean passa boa parte do dia andando pela sala, brincando com o que quer. Eu me preocupo com isso. Onde estão os círculos com música e as atividades organizadas? Logo percebo que toda essa liberdade é intencional. De novo, é o modelo de cadre francês: as crianças têm limites firmes, mas muita liberdade dentro desses limites. E precisam aprender a lidar com o tédio e a brincar sozinhas. “Quando a criança brinca, ela se constrói”, diz Sylvie, outra cuidadora de Bean.
Eu percebo que o que deveria afligir os americanos não é apenas se uma creche ruim leva a consequências ruins (é claro que leva), mas o quanto é ruim para as crianças estarem em uma creche ruim. Estamos tão preocupados com o desenvolvimento cognitivo que nos esquecemos de perguntar se as crianças que estão na creche estão felizes e se é uma experiência positiva para elas enquanto está acontecendo. É disso que os pais franceses estão falando.
Capítulo 7: Bébé au lait
Gostar da creche acabou sendo fácil. Gostar das outras mães, não. Estou ciente de que a afinidade instantânea entre mulheres no estilo americano não acontece na França. Ouvi falar que as amizades femininas aqui começam lentamente e podem levar anos para se desenvolver.
Consegui fazer amizade com algumas francesas nesse tempo em que moro em Paris. Mas a maioria nem tem filhos ou mora do outro lado da cidade. Eu simplesmente supus que também conheceria outras mães do meu bairro com filhos da mesma idade de Bean. Na minha fantasia, trocaríamos receitas, organizaríamos piqueniques e reclamaríamos de nossos maridos. É assim nos Estados Unidos.
Tudo bem, estou no meio de Paris, sem dúvida um dos lugares onde as pessoas são menos simpáticas no mundo. A expressão de desprezo deve ter sido inventada aqui. Até as pessoas do resto da França dizem que acham os parisienses frios e distantes.
Nos círculos de classe média nos Estados Unidos, muitas mães tratam as fórmulas infantis como praticamente uma forma de abuso infantil. O fato de que amamentar exige resistência, inconveniência e, em alguns casos, sofrimento físico só aumenta o status.
Os pais franceses não veem motivo para acreditar que o leite artificial é terrível e nem para tratar a amamentação como um ritual sagrado.
Você não vai silenciar nenhum aposento em Paris ao perguntar como vai a perda de peso das mães de recém-nascidos. Assim como há enorme pressão social para que as mulheres não ganhem muito peso quando estão grávidas, há uma pressão similar para que percam os quilos adicionais rápido depois do nascimento.
Nancy, a irmã em Paris, me diz que alguns meses depois que deu à luz, o namorado francês começou a insistir para que ela parasse de usar calça de moletom e perdesse o pneuzinho. Como incentivo, ofereceu levá-la para comprar roupas novas. Nancy diz que ficou surpresa e ofendida ao mesmo tempo. Como a irmã em Connecticut, ela tinha imaginado estar em uma “zona materna” protegida, onde a aparência não era levada em consideração por um tempo, para que ela pudesse se dedicar a cuidar do bebê.
Eu certamente seria mais magra se tivesse sogros franceses para me alfinetar. Parece que, assim como a obesidade se espalha pelas redes sociais, a magreza também. Se todo mundo ao seu redor decide perder os quilos extras, você tem mais chance de também conseguir. (E também é mais fácil perder peso se você não ganhou muito.)
Em Paris, até as mães que não trabalham tomam como certo que matricularão os filhos em uma creche de meio período para poderem ter um tempo para si. Elas se permitem janelas livres de culpa nas quais vão à aula de ioga e retocam as luzes dos cabelos. Como resultado disso, mesmo as mães mais estressadas que não trabalham fora não chegam no parquinho com aparência esgotada e desgrenhada, como se pertencessem a uma tribo diferente.
Na França, a mensagem social dominante é que, enquanto ser pai e mãe é muito importante, isso não deve suprimir os outros papéis da pessoa. As mulheres que conheço em Paris exprimem isso dizendo que as mães não devem se tornar “escravas” dos filhos.
Capítulo 8: A mãe perfeita não existe
Quando conto para americanos que tenho uma filha, eles costumam perguntar: “Você está trabalhando?” Já os franceses apenas perguntam: “O que você faz?” Nos Estados Unidos, conheço muitas mulheres que pararam de trabalhar para criar os filhos. Na França, conheço uma.
As mães francesas também voltam a trabalhar porque querem. Em uma pesquisa de 2010 feita pelo Pew Research Center, 91 % dos adultos franceses disseram que o tipo de casamento mais satisfatório é aquele no qual tanto o marido quanto a esposa trabalham fora. (Só 71 % dos americanos e britânicos disseram isso.
As mulheres francesas trabalham não só por segurança financeira, mas também por status. Mães em tempo integral não têm muito, ao menos em Paris. Há uma imagem francesa recorrente de uma dona de casa sentada com tristeza em um jantar porque ninguém quer conversar com ela. “Tenho duas amigas que não trabalham. Sinto que ninguém se interessa por elas”, diz Danièle. Ela é jornalista, tem 50 e poucos anos e uma filha adolescente. “Quando os filhos crescem, qual é sua utilidade social?”
Elisabeth, uma mãe francesa que mora no Brooklyn, ficou surpresa de os pais americanos se dedicarem tanto ao sucesso dos filhos nos esportes. Ela escreve que teve que mudar repetidamente a data e a hora da festa de aniversário do filho de 10 anos para encaixar os horários de jogos dos amigos americanos. Cada mãe americana descreveu a presença do filho no jogo como “indispensável” e alegou que, sem ele ou ela, “o time poderia perder!”.
O fato de o estado francês fornecer e subsidiar formas de cuidado infantil torna a vida bem mais fácil para as mães francesas. Mas quando volto para a França, fico impressionada ao ver como as mães francesas tornam suas próprias vidas bem mais fáceis também. O equivalente francês de um encontro para brincar é eu deixar Bean na casa de uma amiga e ir embora.
Na França, existe uma expressão para as mães que passam o tempo todo levando os filhos de um lado para o outro: maman – taxi. Não é um elogio. Nathalie, uma arquiteta parisiense, me diz que contrata uma babá para levar os três filhos a todas as atividades aos sábados de manhã. Ela e o marido saem para almoçar fora. “Quando estou presente, dou 100 % de atenção a eles, mas quando não estou, não estou”, diz Nathalie.
As mães francesas reconhecem a tentação da sensação de culpa. Elas se sentem tão esgotadas e inadequadas quanto nós, americanas. Afinal, elas trabalham enquanto criam filhos pequenos. E, como nós, costumam não chegar ao seu melhor, seja no emprego, seja como mãe. A diferença é que as mães francesas não valorizam a culpa. Ao contrário, elas a consideram não saudável e desagradável, e procuram bani-la.
Elas acreditam que existe um risco de sufocar as crianças com atenção e ansiedade, ou de haver o desenvolvimento da temida relation fusionnelle, na qual as necessidades da mãe e da criança estão misturadas demais. As crianças, mesmo os bebês e as crianças pequenas, passam a cultivar suas vidas interiores sem a interferência constante da mãe.
Capítulo 9: Caca boudin
. A maternelle não é obrigatória e as crianças podem ficar meio período. Mas a grande maioria das crianças de 3 anos na França frequenta a maternelle em período integral e tem uma experiência similar. É o modo francês de transformar as crianças pequenas em franceses.
Para mim, a maternelle parece uma escola de artes para pessoas pequenas. Durante o primeiro ano de Bean, as paredes da sala de aula são rapidamente cobertas com desenhos e pinturas das crianças. Conseguir “perceber, sentir, imaginar e criar” também são objetivos da maternelle. As crianças aprendem a levantar a mão à la française, com um dedo apontando para o alto.
Na verdade, como vou descobrir, as crianças não aprendem a ler na maternelle, que dura até o ano em que fazem 6 anos. Elas apenas aprendem as letras, os sons, e a escrever os próprios nomes. Ouço dizer que algumas crianças começam a ler sozinhas, embora eu não consiga identificar quais, pois os pais não mencionam. Aprender a ler não faz parte do currículo francês até o equivalente ao primeiro ano, o ano em que as crianças completam 7 anos.
Eu sempre fazia Bean dizer as palavras mágicas, “por favor” e “obrigada”, é claro. Mas, no francês, há quatro palavras mágicas: s’il vous plaît (por favor), merci (obrigado), bonjour (oi) e au revoir (adeus). Por favor e obrigado são necessários, mas nem de perto suficientes.
O livreto do governo francês diz que, na maternelle, espera-se que as crianças mostrem seu entendimento de “civilidade e educação”, incluindo “cumprimentar a professora no começo e no final do dia, responder a perguntas, agradecer a pessoa que a ajudar e não interromper alguém que está falando”. As crianças francesas nem sempre dizem bonjour. É comum haver um pequeno ritual no qual o pai ou a mãe força a criança a dizer (“Venha dizer bonjour!”).
“As crianças que ignoram as pessoas e não dizem bonjour e nem au revoir ficam presas dentro de uma bolha. Como os pais já se dedicam a elas, quando elas vão perceber que estão ali para dar, e não só para receber?”
Nos livros americanos, costuma haver um problema, uma luta para resolver o problema e uma solução alegre. A colher queria ser um garfo ou uma faca, mas acaba percebendo o quanto é ótimo ser colher. O garoto que não deixava as outras crianças brincarem em sua caixa de areia é excluído da caixa e percebe que todas as crianças deveriam brincar na caixa juntos. Lições são aprendidas e a vida fica melhor.
Os livros franceses que leio para Bean começam com uma estrutura similar. Há um problema, e os personagens lutam para superá-lo. Mas eles raramente conseguem por muito tempo. É comum que o livro termine com o protagonista tendo o mesmo problema de novo. Raramente há um momento de transformação pessoal, quando todo mundo aprende e cresce.
Capítulo 10 Double entendre
Capítulo 11: Adoro essa baguete
Os amigos me dizem que entre pais de gêmeos existe um alto índice de divórcio. Não tenho certeza se isso está estatisticamente correto, mas entendo como o boato nasceu. Nos meses depois do nascimento dos gêmeos, Simon e eu brigamos constantemente.
Toda mãe falante de língua inglesa com quem converso tem uma história sobre uma mãe de seu círculo social que se recusa a deixar o filho com qualquer pessoa. Essas mães não são lendas urbanas; encontro algumas assim com frequência. Em um casamento, me sento ao lado de uma mãe em tempo integral do Colorado que me explica que tem babá o dia inteiro, mas nunca deixa a babá sozinha com os três filhos. (O marido não foi ao casamento para cuidar deles.)
Os pais franceses até têm momentos de adultos quando os filhos estão em casa. Florence, de 42 anos, com três filhos entre 3 e 6 anos, me diz que, nas manhãs de fim de semana, “as crianças não têm o direito de entrar em nosso quarto até abrirmos a porta”. Até aquele momento, milagrosamente, eles aprenderam a brincar sozinhos.
A desigualdade francesa fica especialmente evidente em casa. As mulheres francesas passam 89% mais tempo do que os homens fazendo trabalhos domésticos e cuidando dos filhos.6 Nos Estados Unidos, as mulheres passam 31% mais de tempo do que os homens em atividades domésticas, e 25% mais nos cuidados com os filhos.
Nos Estados Unidos, as mulheres passam 31% mais de tempo do que os homens em atividades domésticas, e 25% mais nos cuidados com os filhos.
As mulheres francesas sem dúvida ficam cansadas de bancarem a mãe, esposa e trabalhadora simultaneamente. Mas elas não culpam os maridos automaticamente por isso, ou pelo menos não com o veneno com o qual as americanas costumam fazer.
Há motivos estruturais para as mulheres francesas parecerem mais calmas do que as americanas. Elas tiram 21 dias de férias a mais por ano. A França tem menos retórica feminista, mas tem muito mais instituições que permitem que as mulheres trabalhem. Existe a licença-maternidade paga pelo governo (os Estados Unidos não têm), as babás subsidiadas e as creches, a pré-escola universal gratuita a partir dos 3 anos da criança e a miríade de créditos em impostos e pagamentos por se ter filhos. Tudo isso não garante que haja igualdade entre homens e mulheres. Mas garante que as mulheres francesas possam ter uma carreira e filhos. Se você deixar de lado a esperança inalcançável da igualdade meio a meio, é mais fácil apreciar o fato de que alguns maridos franceses cuidam bastante dos filhos, cozinham e lavam a louça. Um estudo francês de 200611 descobriu que apenas 15% dos pais de crianças pequenas participavam igualmente do cuidado do bebê, e que só 11% assumiam a responsabilidade principal. Mas 44% tinham papéis de bastante apoio. Você vê esses pais, adoravelmente desarrumados, empurrando carrinhos no parque nas manhãs de sábado e levando sacolas de compras para casa depois.
Capítulo 12: Você só precisa experimentar
Foi bem difícil tentar incutir hábitos franceses em Bean quando ela era filha única. Agora que temos três crianças em casa, e somos só dois adultos, criar um cadre francês é bem mais difícil. Mas também é bem mais urgente. Se não controlarmos as crianças, elas vão nos controlar.
Atender a necessidades seletivas dá muito trabalho. Uma mãe que conheço de Long Island faz um café da manhã diferente para cada um dos quatro filhos, e um quinto para o marido.
Como mencionei, as crianças francesas costumam comer só nos horários das refeições e no goûter da tarde. Nunca vi uma criança francesa comendo pretzels (ou nenhuma outra coisa) no parque às dez horas da manhã.
O que acontece é que os pais franceses não iniciam a alimentação do bebê com grãos sem gosto e sem cor. Desde a primeira mordida, eles servem legumes cheios de sabor para os bebês. As primeiras comidas que os bebês comem tipicamente são vagem, espinafre, cenoura, abobrinha descascada e as partes brancas do alho – poro, cozidas no vapor e em forma de purê.
Os bebês americanos também comem legumes e verduras, é claro, às vezes até desde o começo. Mas nós, falantes de língua inglesa, tendemos a vê-los como veículos obrigatórios de vitaminas e os agrupamos mentalmente em uma categoria sem graça chamada “legumes e verduras”.
O guia de alimentação do governo diz para os pais oferecerem os mesmos ingredientes preparados de muitas maneiras diferentes. “Experimente cozido no vapor, assado, assado no papel-manteiga, grelhado, puro, com molho ou temperado.” Os autores do guia dizem: “Seu filho vai descobrir cores diferentes, texturas diferentes e aromas diferentes.”
O experimento de Stein Garten resume a abordagem francesa à alimentação das crianças: se você fica experimentando as coisas, acaba passando a gostar de quase todas.
Na festa de aniversário de 5 anos de Bean, anúncio que é hora do bolo. De repente, as crianças, que estavam brincando de forma barulhenta, fazem fila em direção à nossa sala de jantar e se sentam calmamente à mesa. Todas são sabe imediatamente. Bean se senta à cabeceira da mesa e entrega pratos, colheres e guardanapos. Exceto por acender as velas e carregar o bolo, não faço muita coisa. Aos 5 anos, se sentar calmamente à mesa para qualquer tipo de alimentação já é um reflexo automático para as crianças francesas. Não há possibilidade de comer no sofá, na frente da televisão e nem enquanto usa o computador.
Capítulo 13: Sou eu quem decide
Uma das partes mais impressionantes da educação francesa, e talvez a mais difícil de dominar, é a autoridade. Muitos pais franceses que conheço têm uma autoridade calma e tranquila com os filhos que só consigo invejar. Os filhos realmente os ouvem. As crianças francesas não saem correndo constantemente, não respondem e nem se empenham em negociações prolongadas. Mas como exatamente os pais franceses conseguem isso? E como posso adquirir essa autoridade mágica?
“O jeito francês às vezes é rigoroso demais. Eles podiam ser um pouco mais gentis e simpáticos com os filhos, na minha opinião”, diz ela. “Mas acho que o jeito americano é extremo demais e cria os filhos como se eles fossem os donos do mundo.”
Os pais anglófonos têm medo de que ser rigoroso demais destrua a alma criativa do filho. Muitos pais de língua inglesa que conheço se veem nessa estranha zona intermediária, em que estão tentando ser tanto o ditador quanto a musa para os filhos. O resultado é que acabam negociando constantemente.
Na mídia francesa e entre as gerações mais velhas, fala-se da síndrome sem limites do “filho rei”. Mas, quando converso com pais em Paris, o que ouço o tempo todo é “Cest. moi que décide”, sou eu quem decide. Há outra variação um tanto mais militante, “Cest. moi que comande”, sou eu quem manda. Os pais dizem essas frases para lembrar tanto aos filhos quanto a si mesmos quem está no comando.
Para os pais franceses, morar com um filho rei parece um desequilíbrio violento e é ruim para toda a família. Eles acham que tiraria boa parte do prazer do dia a dia, tanto para os pais quanto para as crianças. Eles sabem que construir esse carde requer enorme esforço, mas acreditam que a alternativa é inaceitável.
Falando em elevar a voz, eu pareço fazer isso bastante. Gritar parece funcionar às vezes para fazer com que as crianças escovem os dentes ou lavem as mãos antes do jantar. Mas exige muito de mim e cria um ambiente terrível. Quanto mais alto eu grito, pior me sinto depois, e mais cansada fico.
. É difícil atingir um equilíbrio entre ser o chefe, mas também ouvir uma criança e respeitá-la. A questão é impor limites, mas também é observar seu filho, construir a cumplicidade e se adaptar ao que a situação exigir.
Não deixe que nenhuma súplica amoleça seu coração; que o seu ‘não’, depois de dito, seja uma parede de metal contra a qual a criança pode gastar toda a sua força cinco ou seis vezes, mas no final pare de tentar superá-la. Assim, você vai torná-la paciente, tranquila, calma e resignada, mesmo quando não tem tudo o que quer.”
Criar um carde para seus filhos dá muito trabalho. Nos primeiros anos, requer muita repetição e atenção. Mas, quando está estabelecido, torna a vida muito mais fácil e calma (ou é o que parece). Em momentos de desespero, começo a dizer para meus filhos, em francês: “Cest. moi que decide” (Sou eu quem decide). Apenas o fato de dizer essa frase já é estranhamente fortalecedor. Minhas costas se enrijecem um pouco quando a enuncio.
Capítulo 14 Deixe que ela viva a vida dela
Um dia, um aviso são colocados na escola de Bean. Ele diz que os pais dos alunos de 4 a 11 anos podem matriculá-los em uma viagem de verão para o Haute-Vosges, uma região rural a cerca de cinco horas de carro de Paris. A viagem, sem pais, vai durar oito dias.
Está claro que dar às crianças um grau de independência e estimular uma espécie de flexibilidade interna e autoconfiança é parte importante da educação de filhos na França. Os franceses chamam isso de autonomia (autonomia). Eles costumam querer dar à criança o máximo de autonomia que ela consegue ter. Isso inclui autonomia física, como as viagens escolares. Também inclui a separação emocional, como deixar que eles construam sua própria autoestima, que não dependam do elogio dos pais e de outros adultos.
Os pais franceses não parecem ter medo de que algum coisa ruim vá acontecer nesses passeios.
Talvez eu me acostume com essas viagens, apesar de não ter inscrito Bean em nenhuma ainda. Minha amiga Esther propõe que enviemos nossas filhas juntas para uma colônia de vacances no próximo verão, quando terão 6 anos. Acho difícil de imaginar. Quero que meus filhos sejam autossuficientes, flexíveis e felizes. Só não quero soltar as mãos deles.
O futuro em francês
Como os franceses dizem, “encontrei meu lugar”. O fato de eu ter feito amigos maravilhosos ajuda.
O que realmente me conectou com a França foi descobrir a sabedoria do jeito francês de educar filhos. Aprendi que as crianças são capazes de feitos de autossuficiência e comportamento cuidadoso que, como mãe americana, eu talvez jamais imaginasse. Não posso voltar a não saber isso, mesmo se eu acabar indo morar em outro lugar.
Ainda luto por aquele ideal francês: escutar genuinamente meus filhos sem sentir que preciso ceder aos desejos deles. Ainda declaro “sou eu quem decide” em momentos de crise, para lembrar a todos que estou no comando.